Uma enorme parede de água salgada se estende a poucos metros das primeiras casas na orla da praia de Nazaré. Do forte, construído no século 16, é possível ver a onda se agigantar por 30 metros, como se fosse engolir a cidade.
Nazaré é uma vila simpática no centro-oeste de Portugal, com forte identidade cultural e uma vida agradável à beira-mar. Mas foram as ondas gigantes que se formam ali que tornaram o lugar conhecido no mundo inteiro e um desafio para os surfistas mais aventureiros.
Desafio, aliás, não livre de perigos. Há alguns anos, a cidade ganhou os noticiários brasileiros depois de um grave acidente envolvendo a surfista Maya Gabeira. Ao tentar encarar a onda gigante, ela caiu de uma altura de cerca de 20 metros, tomou alguns caldos e desmaiou.
A história só não teve um fim trágico porque seu amigo e também surfista Carlos Burle conseguiu resgatá-la a tempo e aplicar os procedimentos de primeiros socorros. No fim, só um tornozelo quebrado, apesar do susto. Mas quando a gente conta essa história, fica até difícil acreditar que no dia da minha visita o mar estava assim:
É que as ondas enormes que fazem a fama do local costumam se formar no inverno (mais ou menos de outubro a janeiro), devido a existência de um cânion a poucos quilômetros da costa. A diferença de profundidade das águas do cânion em comparação às da plataforma continental, que é rasa, reforçada pelas correntes costeiras, é o que cria o fenômeno.
E como as ondas são um fenômeno difícil de ignorar, a cultura da cidade também floresceu ao redor delas. Fortemente apegadas ao mar, as pessoas de Nazaré precisaram aprender a conviver com elas para manter viva a economia e as tradições locais.
Até hoje, todos os dias, por volta das seis da manhã, os homens entram em seus barcos e vão em busca do peixe que serve de alimento e ganha-pão para suas famílias. As mulheres aguardam a volta de seus maridos na praia, muitas vezes com canções e rezas para que retornem em segurança.
No fim da tarde, elas comandam o leilão dos peixes e frutos do mar, sempre vestidas com suas tradicionais sete saias coloridas. Essa tradição é tão difundida que, mesmo hoje, é fácil encontrar senhoras vestidas assim no dia a dia.
É que as sete saias não são apenas um traje típico; elas contam uma história e tem um simbolismo que abarca diferentes aspectos da vida das mulheres nazarenas. Diz-se que elas simbolizam as sete virtudes, os sete dias da semana, as sete cores do arco-íris, e até as sete ondas do mar.
Mas a tradição tem uma origem bem mais prática. No passado, as mulheres costumavam vestir várias camadas de saias para se manterem aquecidas enquanto esperavam seus maridos retornarem do mar.
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Mesmo em época de ondas gigantes, a pesca é prioridade. Enfrentar o fenômeno é uma prova de coragem e responsabilidade nessa cultura. Acredita-se que cada família nazarena tenha pelo menos um caso de morte por afogamento nas perigosas águas daquele pedaço de Atlântico.
Mas é nesta interação entre o respeito e o desafio ao oceano que a identidade nazarena se fortalece, em um testemunho da resiliência humana diante da força da natureza.
Talvez por isso, a cultura local ainda preserva um forte senso de religiosidade. Bençãos e procissões são um aspecto central da vida na vila, profundamente entrelaçada com a cultura e as tradições locais.
O centro , localizado sobre uma elevação rochosa com vista para o Atlântico, é palco de um dos mais significativos símbolos religiosos da região, o “Miradouro do Suberco”. Este local é famoso pelo Milagre da Nazaré, onde, segundo a lenda, um cavaleiro no século 12 foi salvo de uma queda iminente ao invocar Nossa Senhora da Nazaré.
Em agradecimento, ele construiu a Ermida da Memória, ainda presente no local. Isso deu início ao culto a Nossa Senhora da Nazaré na cidade, com a Romaria de Nazaré acontecendo anualmente no dia 8 de setembro.
As Festas da Nazaré, realizadas anualmente desde a Idade Média, são um evento significativo que celebra o milagre de Nossa Senhora da Nazaré. Estas festas atraem multidões de vinte a trinta mil pessoas, incluindo peregrinos de várias regiões. A celebração tem um componente religioso centrado no Santuário, com missas, pregações e procissões, e um componente profano com festividades que incluem touradas, danças, jogos, corridas de cavalos, pirotecnia, malabaristas, e espetáculos de teatro, ópera e música.
Essas tradições e festividades religiosas refletem a profunda conexão dos nazarenos com sua fé e a importância da religião na vida cotidiana da comunidade. A religiosidade em Nazaré é um elemento vital que molda a identidade cultural e a história da vila, demonstrando a força e a resiliência de seu povo diante das forças da natureza e dos desafios do tempo.
E assim vive Nazaré, com um pé no mar, outro na terra; com uma dose de coragem e outra de fé. Como quem se agarra em Deus, mas sabe que vencer o oceano todos os dias é trabalho de cada um.
Disclaimer: Esse texto foi publicado originalmente no 360meridianos, mas acabou cortado em uma auditoria de conteúdo. Parte dele foi incorporado a outro texto de Nazaré, mas eu resolvi trazê-lo aqui na íntegra, pois acredito que a internet não deve ser feita para robôs. Espero que gostem!
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Parece ser um lugar fabuloso e incrível. Gosto muito de conhecer essas outras culturas. Elas são riquíssimas. Esse peixe fresco e morar perto da praia devem ser maravilhosos.
Boa semana!
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Até mais, Emerson Garcia
É realmente muito legal! Um dos lugares que mais gostei de conhecer em Portugal!